22/05/2014

Cartas de Évora V

Quero contar-te que conheci um homem maior que tu. Foi talvez por fugir disso que naquela noite me viste no Porto, de mini Super Bock na mão, a fingir que não te vira. Sem ele, eu nunca seria uma mulher disponível para quebrar o gelo. Com ele, toda a minha vida se tornou perplexidade, vontade de ir embora, desejo de saber quem eras. Procurei-o em mim sempre que nada valia a pena - a lembrança nublada de várias Leffes ainda hoje me fazem continuar. Ele era o homem da guitarra. A cidade inteira sabia que o amava para lá do razoável - e que o amaria sempre, pela simples razão de que nós não nos conhecíamos, não de verdade. E isso pouco me importava. Era um amor que me mantinha em marcha. Que me mantinha. Era uma lembrança recriada à qual me agarrei quando me tiraste da tua vida.
Porque ele era um homem maior, muito maior que tu. Na tua ausência, eu fazia-me pequena e escondia-me o melhor que podia dentro das noites. Era a ausência dele que me acordava. 
Há dois meses escrevi-lhe: queria-o na minha vida, desta vez, a sério. Há pessoas que nunca se vão realmente embora e ele podia até ser uma delas, mas desta vez, eu queria-o aqui. Queria-o em Lisboa. Queria a voz dele em Lisboa, com as respectivas rugas de expressão e com a devida bagagem.