23/09/2011

Cartas de Coimbra XLVIII, o regresso

Ainda bem que não pedi que viesse. Tenho no corpo a tentação de prosseguir na espiral que foram os últimos 12 meses, de olhar para trás e chorar até não me conseguir mexer. Foi há quase um ano que um homem normal me trocou o coração por um Fado de Amália, me guardou sob um chapéu-de-chuva uma noite inteira, me prometeu que o mundo jamais voltaria a ser o mesmo. Há dois meses, um homem normal deitava a cabeça no meu peito despido e desenhava fórmulas quiméricas na pele dos meus braços tensos e inúteis. A vida era uma perfeita aventura e hoje uma provocação constante para que me equilibre entre o sonho e o pesadelo de ser parte de Coimbra outra vez. Eu não sou parte de coisa nenhuma. Não pertenço aqui e naquele longe que se fez tão perto, fomos apenas pedras demasiado versáteis que nos encaixávamos onde tudo se poderia encaixar. Não sei sequer do que sinto falta. Aos poucos, vou-me sentido novamente inteira. Os medos, as crises de choro, os caprichos, o álcool entornado em todas as memórias de amor e ódio... tudo isso sou eu, foste tu, nós dois e os outros, ao tudo que roubámos entre lençóis, ao tudo que descobri com a sobriedade e a tristeza das manhãs. Fui feita para ser uma eterna exilada. Sou boa no limiar da tristeza, mas não aguento os compassos de espera, em que os homens da nossa vida se desvanecem e os nossos melhores amigos nos falham e, vamos realizando sonhos de uma vida sem que os brindes com vinho da casa nos satisfaçam.